A relação entre o sistema nervoso e doenças inflamatórias da pele tem sido cada vez mais estudada e uma molécula vem ganhando destaque nesse cenário: o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP). Originalmente associado à patogênese da enxaqueca, o CGRP também pode desempenhar um papel importante no desenvolvimento da acne e da rosácea, trazendo novas possibilidades terapêuticas para a dermatologia.
O que é CGRP e por que ele importa para a pele?
O CGRP é um neuropeptídeo envolvido em vasodilatação e inflamação neurogênica. Sua ativação já está bem estabelecida na fisiopatologia das enxaquecas — mas estudos recentes apontam que ele também está presente nas glândulas sebáceas e que seu bloqueio pode reduzir a inflamação provocada pelo Cutibacterium acnes, principal agente envolvido na acne.
Além disso, pacientes com rosácea e enxaqueca tratados com anticorpos monoclonais anti-CGRP (CGRPi mAbs) relataram melhora simultânea nos sintomas cutâneos, sugerindo um efeito terapêutico cruzado.
Estudo: inibição do CGRP reduz risco de acne e rosácea
Um estudo de coorte recente avaliou mais de 62 organizações de saúde nos EUA através da base TriNetX, com foco em pacientes com enxaqueca tratados com diferentes classes de medicamentos:
- CGRPi mAbs (inibição direta)
- Gepants (inibidores não peptídicos)
- Triptanos (inibição indireta do CGRP)
- Topiramato (sem efeito sobre CGRP)
Após pareamento por escore de propensão e exclusão de potenciais confundidores, os resultados mostraram que os pacientes tratados com CGRPi mAbs tiveram menor risco de desenvolver acne e rosácea em comparação com todos os outros grupos:
- Acne: redução de até 29% no risco (HR 0,71 vs triptanos)
- Rosácea: redução de até 47% (HR 0,53 vs triptanos)
Os resultados foram consistentes mesmo em análises de sensibilidade com 2 anos de acompanhamento.
O que isso significa para a prática dermatológica?
Esses achados reforçam a hipótese de que o CGRP participa da inflamação cutânea crônica, e que sua inibição pode representar uma nova estratégia terapêutica para acne e rosácea, especialmente em pacientes refratários às opções tradicionais ou com comorbidades como enxaqueca.
Embora ainda sejam necessários ensaios clínicos randomizados para validar o uso de inibidores de CGRP com esse objetivo, os dados já sugerem um caminho promissor.
Limitações e considerações
É importante ressaltar que este é um estudo observacional, com limitações como:
- Falta de dados sobre dosagem e adesão
- Potencial viés de classificação
- Inexistência de avaliação dose-resposta
Ainda assim, o uso de dados amplos, metodologias robustas de pareamento e exclusões estratégicas tornam os resultados relevantes para a geração de hipóteses futuras.
Conclusão: O CGRP é um alvo promissor na dermatologia?
Sim — e com evidência crescente. Para dermatologistas que tratam pacientes com acne ou rosácea, especialmente aqueles com histórico de enxaqueca, conhecer o papel do CGRP pode abrir portas para uma abordagem mais integrada e inovadora.
Fique atento: o futuro dos tratamentos dermatológicos pode estar mais ligado ao sistema nervoso do que imaginávamos.
Leia aqui o artigo na íntegrahttps://jamanetwork.com/journals/jamadermatology/fullarticle/2820913?resultClick=1https://jamanetwork.com/journals/jamadermatology/fullarticle/2820913?resultClick=1